domingo, 23 de agosto de 2020

Claudomiro de Almeida Cortes - Guarda-Parque no Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros (PNCV)

Clau e seu amor pela natureza
O Guarda-Parque Claudomiro de Almeida Cortes, nascido e criado na Chapada dos Veadeiros, trabalhou no Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros (PNCV) por 13 anos nessa função. Nesse trabalho, junto com a equipe do PNCV, criou a Associação dos Catadores de Semente que hoje já conta com 80 famílias envolvidas no projeto. Um projeto que gera renda para as comunidades na Chapada dos Veadeiros, preserva e restaura o Cerrado.
  

Clau, como é conhecido, diz que a grande vantagem de ser um guarda-parque foi cuidar do nosso maior patrimônio – que para ele hoje é o cerrado e o PNCV. Para a função de Guarda-Parque, são contratadas pessoas da região do entorno dos Parques. Ele, fazendo parta da história dessa região, comenta que veio de família de agricultor e garimpeiro, que só destruíam, não viam o lado importante que era preservar a natureza.

Trabalhando  como Guarda-Parque, Clau desenvolveu essa consciência que preserva hoje: a natureza era a única chance/oportunidade de garantir o futuro de novas gerações, dos netos e bisnetos que vão vir nesse futuro. Para ele, esse é um conhecimento que só sendo Guarda-Parque para desenvolver essa consciência.


Clau em ações de educação ambiental


No seu trabalho de guarda-parque houveram situações bem difíceis também, que ele vai nos contar:

“Vou falar de 1 ou 2 que tive. A gente que trabalha de guarda-parque, como é nascido e criado aqui, gosta da natureza e não queria ver queimar (o cerrado). Quando tinha incêndio a gente ia também. Arrumava um jeito de ajudar, todo guarda-parque ia pro combate.”

Clau lembrou que eles foram combater um incêndio na Serra do Ministro, que é dentro do PNCV. Como Clau já acumulava 8 anos de trabalho no PCNV e já conhecia bem o Parque, ficou no comando da brigada para combater o incêndio nessa Serra. Saiu do alojamento as 4 da manhã, e por volta das 14h chegaram no incêndio e começaram a combater o fogo.

Começou no pé do morro e foi subindo, quando chegaram no topo do morro, a água dele e da brigada que usava a bomba costal (parte da brigada usa abafador e outra parte bomba costal para jogar água no fogo) tinha acabado. Ele então chamou 3 pessoas, desceram o morro para pegar água na vereda, local que tinha água mais próximo – eram por volta das 21h.

Quando estavam voltando, Clau e sua equipe, no meio da Serra do Morro/Ministro, viram que o fogo queimou uma árvore. O problema é que tinha uma pedra imensa encostada nessa árvore. Essa pedra saiu do lugar que estava (ele acha que o fogo queimou a árvore e ela rolou montanha abaixo) e começou a rolar montanha abaixo... ela era gigante que nem um carro!!!


O cansaço após horas de combate ao fogo no Parque Nacional


Nesse momento que a pedra se locomovia morro abaixo, a equipe da brigada que estava no topo, gritava alto e com medo: “cuidado que vai a pedra!!!”. Eles estavam com muito medo mesmo porque a pedra rolava, e quando ela batia na terra, cavava e iam rolando outras pedras... se pegasse uma pessoa já era.
  

Segundo Clau:

“A gente escutava só os gritos, mas fazer o que? A serra grande, a pedra vinha muito rápido... a gente tava cansado. Ai a gente olhou próximo... era umas 21h. Ai tinha umas pedras não tão grandes (perto) mas dava pra gente se esconder, ai a gente agachou, encostou nas pedras e a grande vinha pulando e aproximando... Ai a pedra ia muito rápido então ela batia e fazia um pulo, teve uma hora que ela aproximou de onde a gente tava, ela bateu no chão e fez um pulo muito grande".

Parecia que ela tinha parado. Mas ela deu um pulo grande, então ela tava viajando no ar. E essa pedra bateu 3m perto da gente!!! E a pedra desceu que desceu mesmo... e quando ela batia, ela tirava umas pedras pequenas que iam descendo o morro e descia muito rápido. E quando batia nas árvores, tirava a casca, se batesse na gente... noooossa.”

Ele conta que desde desse dia, Rafael – analista no ICMBio que trabalhava no PNCV, disse que não ia mais pro fogo não – era coisa de doido.

Outro causo que Clau conta envolveu Luis Neves, atual chefe do PNCV. Ele conta:

“Luiz Neves, um atual chefe do PNCV ficou no mato das 10h da manhã e passou o restante do dia... ficando até 1 da manhã com esse incêndio grande em toda a região do Parque. O rádio tinha acabado a bateria.. um sufoco. Evento engraçado mas duro (risos).”

O causo com Luis Neves, foi em 2017 no incêndio gigante da Chapada dos Veadeiros - saiu em todos os jornais do Brasil. Clau comenta que:

“Já tinha mais de 2 semanas o incêndio... Alí perto do mulungu, próximo do rio preto, Luis ficava na base para levar comida para brigada. Usava quadriciclo: ia até o ponto que o quadriciclo conseguia levar e de lá ele andava até chegar onde a brigada tava combatendo. Aí ele foi levar comida pra brigada que tava comigo (tem até reportagem no fantástico sobre) e aí o quadriciclo quebrou. Aí nós esperou Luiz e nada... passava o rádio e pensava “pode ser que quebrou”, e decidimos ir embora.

Ai fomos para outro incêndio. Matou aquela linha (de fogo) e foi para outra parte - no mesmo incêndio mas em outra região. Ai era 10h da manha e nada de Luis... ai passou o dia todo, entrou a noite... quando foi 23h nada do rádio e “CADÊ LUIS?” “Uai, mas ele não apareceu?”.

O povo focado em incêndio, ninguém falou nada.

Ai eu peguei o rádio, chamei todo mundo, mais de 50 brigadistas procurando o Luis. O rádio dele tinha descarregado e a gente não conseguiu falar com ele. Ai peguei todos os brigadistas, coloquei em uma linha/faixa espalhado e todo mundo andando no sentido que Luis tinha dado o último sinal de vida, a última localização. Ai a gente achou ele as 1h da manhã, cansado... achava que tinha até morrido, mas aparentemente tava cansado demais e dormiu ali mesmo. E a gente doido procurando...”

Veja abaixo outras fotos de Clau em ação!





 

quarta-feira, 6 de maio de 2020

NOTA DE PESAR E REPÚDIO À ESCALADA DE VIOLÊNCIA


3 de maio de 2020 - O coletivo de organizações abaixo assinadas se solidariza com os familiares e colegas de Damião Cristino de Carvalho Júnior, que perdeu a vida no cumprimento de seu trabalho na defesa do Parque Estadual (PE) Intervales em Sete Barras, estado de São Paulo, conforme nota de pesar da Fundação Florestal. Também repudiamos de forma veemente a escalada de violência e ilegalidade na causa socioambiental de norte a sul do Brasil, matando inocentes, como acaba de acontecer em São Paulo.
Segundo informações da Fundação Florestal, no dia 1o de maio ocorreu uma operação integrada da Força Tática do Pelotão da Polícia Ambiental de Registro-SP com a equipe de Fiscalização do PE Intervales. O objetivo era monitorar uma área onde, em abril, um garimpo clandestino já havia sido desmantelado. A operação se deparou com um novo garimpo, onde equipamentos novos para as atividades ilegais haviam sido transportados de helicóptero.
Os infratores foram surpreendidos no local e reagiram com tiros. Um deles foi preso, e os demais fugiram após trocar tiros com a polícia. Um membro da operação, o vigilante Damião Cristino de Carvalho Júnior, foi alvejado na cabeça durante o conflito, e outro guarda-parque, na perna. Após duas horas de tiroteio, a equipe da operação conseguiu se alojar em um local seguro. Por ser uma área remota de difícil acesso, o resgate só foi possível na manhã seguinte. Depois dos feridos serem hospitalizados, infelizmente Damião não sobreviveu.
A proteção de Unidades de Conservação (UCs) como o PE Intervales depende principalmente de guarda-parques, profissionais preparados e capacitados para a execução dos programas de gestão dessas áreas. São o elo fundamental entre as políticas públicas e as comunidades locais nas áreas onde desempenham seu trabalho.
A gestão das UCs do Brasil tem sofrido com a redução de equipe e a precarização da infraestrutura dos sistemas de proteção ambiental. Isso acaba gerando uma pressão ainda maior sobre os guarda-parques e os serviços terceirizados de vigilância que estão à frente da proteção do patrimônio natural do Brasil.
O crime ocorrido no Dia do Trabalho compartilha características comuns à escalada de violência e destruição dos recursos naturais que vemos também de norte a sul do Brasil, da Amazônia à Mata Atlântica: o discurso e as ações do governo federal fortalecem a permissividade de invasões ilegais para atividades clandestinas como o garimpo, que geram impactos ambientais praticamente irreversíveis nas áreas destinadas a preservar a natureza e o bem-estar de toda a sociedade.
Este ato de violência contra a vida das pessoas e ao pouco que resta da Mata Atlântica acontece pouco depois da divulgação de um novo decreto do governo federal que pode reduzir a proteção ao bioma mais devastado do Brasil, para beneficiar interesses do setor imobiliário. Segundo o site Direto da Ciência, a proposta do ministro do meio ambiente Ricardo Salles, cuja minuta já está na Casa Civil da Presidência da República, pretende alterar o Decreto 6.660, de 2008, que regulamenta a Lei da Mata Atlântica (Lei 11.428, de 2006). A ideia é manter a proteção legal apenas para as formações tipicamente florestais, o que pode reduzir a proteção do bioma em 10%.
Escalada de violência com assassinatos de lideranças comunitárias; aumento de desmatamento, invasões e de ilegalidade; a recente demissão de fiscais do Ibama; desmantelamento dos sistemas de proteção do patrimônio natural do país. Enquanto o mundo todo prioriza o combate à maior pandemia dos últimos 100 anos, é lamentável que o Brasil sofra ainda mais com ações do governo tão letais quanto o vírus.
Precisamos proteger e apoiar os profissionais que defendem o Brasil, e não colocá-los em condições de maior risco no cumprimento de seu trabalho.

Sobre o Parque Estadual Intervales
Localizado na área núcleo do Contínuo Ecológico de Paranapiacaba e com uma área de 41 mil hectares, o Parque Estadual Intervales protege, junto com outras unidades de conservação, o segundo e mais importante corredor ecológico de Mata Atlântica do estado paulista. Abriga extensa área de manancial, sítios arqueológicos, mais de 150 cavernas catalogadas (principais atrativos) e 123 espécies de fauna e flora ameaçadas de extinção, entre elas, mamíferos, como a jaguatirica, a onça-pintada e o mono-carvoeiro ou muriqui-do-sul (maior primata das Américas). Outro atrativo está na observação das mais de 300 espécies de aves registradas, como a rara jacutinga. O território foi tombado em 1985 pelo CONDEPHAAT e declarado Reserva da Biosfera da Mata Atlântica em 1991. Em 1999, foi reconhecido pela UNESCO como Sítio do Patrimônio Mundial Natural. O nome Intervales corresponde ao termo “entre os vales”, referência a localização da sede do Parque, na divisa das bacias hidrográficas dos rios Ribeira de Iguape e do Paranapanema, no alto da Serra de Paranapiacaba. Fonte: Guia de Áreas Protegidas do Estado de São Paulo.
Assinam esta nota:
• Apremavi
• Caminho da Mata Atlântica
• Climainfo
• COESUS – Coalizão Não Fracking Brasil
• Conservação Internacional
• Engajamundo
• Fundação SOS Mata Atlântica
• ICLEI América do Sul
• IEB – Instituto Internacional de Educação do Brasil
• IEMA  – Instituto de Energia e Meio Ambiente 
• Imaflora
• Iniciativa Verde
• Instituto Internacional Arayara
• Instituto Semeia
• IPÊ – Instituto de Pesquisas Ecológicas 
• ISA – Instituto Socioambiental
• Mater Natura – Instituto de Estudos Ambientais
• Movimento Conservatio – Cultura de áreas protegidas
• Observatório do Clima
• PHS – Projeto Hospitais Saudáveis
• Projeto Saúde e Alegria
• Rede Pró-UC
• RELLAC-Jovem – Rede de Jovens Líderes em Áreas Protegidas e Conservadas da América Latina e do Caribe
• SOS Amazônia
• SPVS – Sociedade de Pesquisa em Vida Selvagem e Educação Ambiental
• 350·org
• TNC
• WWF-Brasil